Prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher” reconhece trabalho sobre alimentação no cárcere da pesquisadora Beatriz Santos

Por Camila Montagner

A pesquisadora Beatriz Oliveira Santos que teve sua pesquisa premiada (Foto: Arquivo pessoal)

Anunciado no início dessa semana, o Prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher” contou na edição atual com a categoria “meninas na ciência”, dedicada a pesquisas de iniciação científica, premiando na área de Biológicas e Saúde o trabalho de Beatriz de Oliveira Santos, agora formada em nutrição na USP, doutoranda e pesquisadora do Cosmopolíticas do Cuidado. Santos, com seu trabalho “Disputas e Arranjos em Torno da Alimentação no Contexto Prisional”, colaborou com o Coletivo de Familiares e Amigos de Presos e Presas do Amazonas (FAPAM) para questionar como o acesso a alimentos externos era vetado reforçando o controle sobre a rotina dos detentos.

Santos já trabalhava pesquisando alimentação no cárcere quando começou a se interessar pelo que acontecia em Manaus, quando conheceu em 2022 o professor e pesquisador do Ilhargas Fábio Candotti (UFAM) e a estudante de direito e militante Priscila Serra. Os dois a colocaram a par do modo como estava sendo vetada a entrada de alimentos que não eram adquiridos, preparados e distribuídos pelo próprio sistema prisional. Esse encontro, mediado pelo orientador de Santos, José Miguel Nieto Olivar (USP), foi o início da construção de uma ponte que a levaria a fazer sua pesquisa junto aos familiares dos detentos que se organizaram e estavam aflitos com a situação.

O trabalho de campo para essa pesquisa foi realizado por Santos entre janeiro e fevereiro de 2023 na cidade de Manaus (AM). Por meio de uma abordagem etnográfica, Santos acompanhou reuniões, atendimentos e encontros realizados pelo Coletivo de Familiares e Amigos do Cárcere do Amazonas, atualmente conhecido como Coletivo Entre Elas. “A colaboração com a Fapam ajudou a estabelecer um diálogo mais estruturado e uma rede de infinitas reflexões em uma parceria que mantemos até hoje”, conta Santos.

Foi essa colaboração que permitiu à pesquisa afirmar que a regulação alimentar faz parte de um processo mais amplo relacionado à expansão do encarceramento em massa no país. “Por meio dos relatos das famílias e dos sobreviventes, entendi que ocorreu após o massacre de 2016 uma mudança significativa na regulação alimentar”, diz Santos, “essas tragédias impulsionaram uma maior rigidez na normatização das unidades prisionais, afetando diretamente as políticas de alimentação, segurança e visitas”.

O massacre que aconteceu em 2016 integra uma disputa de segurança pública que se estende nacionalmente, com desdobramentos no massacre promovido em 2017 em Boa Vista (RR). Mais especificamente, o ocorrido se deu no dia 31 de dezembro de 2016, em que a rebelião no Complexo Penitenciária Anísio Jobim, em Manaus, durou 17 horas e se tornou um marco por conta da morte de 56 detentos.

“A alimentação, nesse contexto, torna-se uma ferramenta de controle e submissão, reforçando a lógica punitiva do encarceramento e ampliando as dificuldades enfrentadas pelos detentos e seus familiares”, argumenta Santos. A pesquisadora, que está começando sua pesquisa de doutorado, espera que seu trabalho seja útil também para os movimentos sociais com os quais o percurso do trabalho foi construído, para além do âmbito universitário.